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Sudha Dharma Mandalam: o ideal esotérico do “Dharma Puro”

No meu percurso pesssoal travei contato com o antigo monasterio AMO+PAX e todo o "guarda-chuva" de ordens ocidentais e orientais que nosso Mestre Jehel, Sri Swami Sevananda organizou na forma de um sistema unificado. Passei então a reconstruir pessoalmente este sistema para minha prática pessoal, e tive a benção e oportunidade de ser recebido na Sudha Dharma Mandala.  Entre as inúmeras tradições que floresceram na Índia moderna, poucas despertam tanta curiosidade entre estudiosos do esoterismo quanto a Sudha Dharma Mandalam — uma ordem espiritual fundada no início do século XX que se apresenta como guardiã do “Dharma Puro”, a sabedoria eterna por trás das religiões. Ao contrário das grandes correntes devocionais do hinduísmo tradicional — como o Vaishnavismo, o Shaivismo ou o Shaktismo —, a Sudha Dharma Mandalam não se estrutura em torno de uma divindade exclusiva nem se limita ao culto ritualístico. Sua proposta é filosófica, ética e iniciática, aproximando-se mais de uma es...
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Tradições Védicas

Falar em “hinduísmo” no singular é, de certo modo, uma simplificação. O que chamamos de hinduísmo é, na verdade, um vasto oceano de tradições espirituais, filosóficas e devocionais que floresceram ao longo de milênios no subcontinente indiano. Não se trata de uma religião centralizada, com um único profeta ou um dogma fixo, mas de um conjunto vivo de caminhos que buscam a mesma verdade essencial: compreender a natureza da consciência e libertar o ser humano do ciclo de sofrimento (saṃsāra). Para entender essa complexidade, é útil distinguir dois grandes níveis: as correntes religiosas (sampradāyas) — focadas na devoção e no culto — e as escolas filosóficas (darśanas) — dedicadas à reflexão metafísica e ao conhecimento da realidade última. No plano devocional, o hinduísmo se expressa através de grandes tradições que se organizam em torno de diferentes deidades, compreendidas não como deuses rivais, mas como manifestações do mesmo Absoluto (Brahman). O Vaishnavismo é a corrente dedicada ...

O pensamento de Boehme

 Jacob Boehme (1575–1624), conhecido como “O Teósofo Alemão”, foi um místico luterano que buscou compreender o problema do mal, a criação do universo e a relação de Deus com o mundo. Considerava que Deus é o fundamento e a causa de tudo o que existe, tendo emanado a si mesmo para se manifestar. Sua mística é entendida como uma relação íntima e pessoal com o Ser Divino, cuja experiência ultrapassa a razão e é apreendida pela “inteligência do coração”, uma intelecção intuitiva e unificadora. Para Boehme, a razão é dual e limitada ao sensível, enquanto o coração iluminado pelo Espírito pode compreender os princípios suprassensíveis. A criação, segundo Boehme, é uma emanação do próprio Deus: o universo e todas as criaturas surgem a partir de sua essência divina. Tudo o que existe contém um duplo impulso, bom e mau; nada há na natureza que não possua essa dualidade fundamental. O bem e o mal são forças necessárias e complementares, cuja tensão dá movimento à vida. Essa concepção dual es...

O martinismo por Amadou

 O Martinismo, conforme exposto por Robert Amadou em Louis Claude de Saint-Martin e o Martinismo (1946), é uma doutrina espiritual e filosófica originada do pensamento do Filósofo Desconhecido, Louis Claude de Saint-Martin (1743–1803). O autor apresenta o martinismo como um sistema místico e teológico que une filosofia, teosofia e prática interior, sendo ao mesmo tempo uma tradição iniciática e uma via de transformação pessoal. Mais do que uma escola doutrinária, trata-se de uma vivência espiritual voltada à Reintegração do Homem em Deus, ou seja, ao retorno do ser humano ao estado primordial de unidade com o divino. A obra distingue claramente o martinismo da corrente dos Elus-Cohen fundada por Martinez de Pasqually, mestre de Saint-Martin. Embora compartilhem o mesmo fundamento — a ideia da Reintegração —, a escola de Pasqually se manteve no plano da teurgia e da maçonaria superior, enquanto Saint-Martin rejeitou os rituais e práticas mágicas, propondo um caminho essencialmente i...

O.T.O. Ritual – Iº Grau - Theodor Reuss (Pré Thelêmica)

“ Os infelizes e necessitados, que não estão despidos nem vestidos, que não usam sapatos ou estão descalços, são aqueles que buscam no solado da porta do templo.” O Buscador deve então despir-se, pondo de lado toda a roupa. Qualquer joia que ele tenha pode, por ora, ser retirada — ele recebe uma camisa branca para vestir — à esquerda do peito e à esquerda do braço ficam expostas, exatamente da mesma forma que o joelho esquerdo e o pé direito (como com o sapato desgastado). Com os olhos vendados e um cordão em volta de seu pescoço, em sua mão esquerda ele segura um compasso aberto a 45 graus, com um único ponto no coração. Enquanto o candidato está na sala da tumba, a Câmara do Silêncio, ele põe esse círculo de lodo, mas, ao novamente abrir os olhos, estes continuam vendados da mesma forma que estavam quando entrou no templo. Prova da Terra Assim que estiver pronto, o Neófito será levado para dentro da Câmara da Reflexão — o túmulo dos mortos e perdidos. Uma pequena vela será trazida ad...

Theosis: um com Cristo

"Pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina” (2 Pedro 1:4). “ Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim” (Gálatas 2:20). Na tradição cristã — especialmente na teologia oriental — a doutrina ortodoxa de “tornar-se como Cristo” é conhecida como Theosis (do grego θέωσις, “divinização” ou “deificação”). A theosis é o processo pelo qual o ser humano, pela graça de Deus, participa da natureza divina, tornando-se semelhante a Cristo — não por essência (pois Deus permanece Deus), mas por participação. Trata-se de um dos conceitos centrais da espiritualidade da Igreja Ortodoxa. A espiritualidade cristã proposta por Thomas de Kempis, em A Imitação de Cristo, apresenta-se como um itinerário interior cujo propósito fundamental é conduzir a alma humana à união com Deus. Mais do que um compêndio de normas religiosas ou um manual de devoção superficial, a obra propõe um caminho de transformação existencial no ...

Boehme e Pasquallys: aproximações e distanciamentos

As doutrinas de Jacob Boehme e Martinez de Pasqually representam duas vertentes complementares da teosofia cristã moderna, unidas pelo propósito de explicar a origem, a queda e a reintegração do homem e do cosmos, ainda que adotem métodos distintos para atingir esse objetivo. Boehme, místico alemão do século XVII, concebe Deus como Ungrund, o abismo sem fundo, um princípio absoluto e indeterminado do qual emana o Desejo divino de se conhecer. Esse movimento gera a dualidade fundamental entre luz e trevas, amor e ira, estabelecendo a base para a manifestação do universo e para o surgimento da consciência humana. A queda resulta da separação da Vontade da Luz, criando exílio e ignorância, tanto no homem quanto nos anjos. Para Boehme, a reintegração não depende de rituais externos, mas da regeneração interior, do despertar da Sophia, a sabedoria divina, e da reconciliação dos opostos na alma, culminando no nascimento do Cristo interior. O homem, como microcosmo do universo, participa ativ...