O Martinismo, conforme exposto por Robert Amadou em Louis Claude de Saint-Martin e o Martinismo (1946), é uma doutrina espiritual e filosófica originada do pensamento do Filósofo Desconhecido, Louis Claude de Saint-Martin (1743–1803). O autor apresenta o martinismo como um sistema místico e teológico que une filosofia, teosofia e prática interior, sendo ao mesmo tempo uma tradição iniciática e uma via de transformação pessoal. Mais do que uma escola doutrinária, trata-se de uma vivência espiritual voltada à Reintegração do Homem em Deus, ou seja, ao retorno do ser humano ao estado primordial de unidade com o divino.
A obra distingue claramente o martinismo da corrente dos Elus-Cohen fundada por Martinez de Pasqually, mestre de Saint-Martin. Embora compartilhem o mesmo fundamento — a ideia da Reintegração —, a escola de Pasqually se manteve no plano da teurgia e da maçonaria superior, enquanto Saint-Martin rejeitou os rituais e práticas mágicas, propondo um caminho essencialmente interior. O martinismo, portanto, é uma doutrina da alma e do coração, uma espiritualidade sem aparato cerimonial, que busca a união direta entre o homem e o Princípio divino.
Louis Claude de Saint-Martin foi um pensador profundamente místico, educado desde a infância numa religiosidade íntima e voltado à contemplação. Influenciado por autores como Pascal, Jacques Abbadie e, sobretudo, Jacob Böhme, acreditava que o homem traz em si o reflexo do divino e que a verdade só pode ser conhecida pelo interior. Sua trajetória espiritual conduziu-o da teurgia de Martinez de Pasqually ao misticismo de Böhme, culminando numa síntese pessoal: a teosofia cristã do coração. Para Saint-Martin, “todos os homens podem ser-me úteis, mas nenhum deles poderia jamais satisfazer-me: Deus me basta”.
O martinismo é, simultaneamente, uma filosofia espiritual, uma mística cristã e uma tradição iniciática. Ele se estrutura sobre três princípios fundamentais: a busca da Verdade, a dialética interior e a mística da Reintegração. A verdade não é aprendida externamente, mas revelada no próprio ser; a dialética martinista é o movimento da razão que se eleva à iluminação interior; e a reintegração é o retorno consciente do homem à sua origem divina. Essa doutrina constitui, portanto, uma via de síntese entre filosofia e mística, razão e fé, inteligência e amor.
Na história, Saint-Martin formou um pequeno círculo de discípulos e amigos, conhecidos como o “Círculo Íntimo dos Amigos de Saint-Martin”, uma sociedade espiritual baseada na comunhão de almas, e não em uma organização ritualística. O elo entre os membros era puramente moral e espiritual, e o ingresso dependia da sinceridade do buscador e de seu “desejo” — termo central em sua obra. O Homem de Desejo é aquele que aspira sinceramente ao conhecimento e à união com Deus, tornando-se o verdadeiro iniciado martinista.
Os conceitos principais dessa tradição incluem: Reintegração, que é o retorno do homem à unidade original com Deus; Homem de Desejo, símbolo do buscador ardente da verdade; Teosofia, o conhecimento experimental e interior do divino; Homem Novo, a criatura regenerada pela luz do Espírito; e Iluminismo verdadeiro, o despertar da luz interior, distinto do racionalismo ou do ocultismo superficial. O martinismo é, portanto, uma pedagogia da alma que visa despertar no homem a consciência do divino em si mesmo.
Saint-Martin convidava seus leitores à experiência direta do espírito, advertindo contra o apego a livros e formas exteriores: “Os livros que fiz só tiveram por meta convencer os leitores a abandonar todos os livros, sem respeitar os meus”. O martinismo, assim, é um estado de consciência, mais do que um sistema ou uma igreja. Sua finalidade é a transformação do ser humano em “Homem Espírito”, capaz de agir no mundo sem pertencer a ele, em harmonia com a Vontade divina.
Em síntese, o martinismo, segundo Robert Amadou, é uma via mística cristã e universal, interior e silenciosa, que busca o despertar do homem novo e sua reintegração no Princípio divino pela união do coração e da inteligência. Trata-se de uma doutrina viva, uma filosofia da Unidade e uma prática de autotranscendência que conduz o discípulo do conhecimento de si à contemplação de Deus.
Frater A∴E∴L∴ FR✛C XII° 4°=7° M∴M∴ S∵I∴L∵I∴ א ש Ch†

Comentários
Postar um comentário